sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Querida Carris,
É do meu entender que a razão da vossa existência, mais do que transportar carradas de gente de um lado para outro, é fazê-lo com um mínimo de conforto. E pelo que tenho visto até têm feito um trabalho minimamente decente a combater as possíveis fontes de irritação numa viagem de autocarro.
Proibiram as pessoas de fumar, o que é realmente uma boa ideia que se um autocarro em hora de ponta já é abafado se ainda por cima fumassem lá dentro aquilo ia parecer uma discoteca com rodas. Também lutaram violentamente contra o mau-cheiro, embora eu ache que é uma batalha perdida, pendurando ambientadores-pinheiro-à lá-carro chunga em todos os cantos do autocarro. A intenção foi boa, ao menos isso, se bem que não contaram com o facto de que tudo o que não está aparafusado ao chão mais cedo ou mais tarde vai ser roubado, e como consequência disto o pinheiro ambientendor da Carris tornou-se uma espécie em vias de extinção. E também esqueceram-se que ambientador+cheiro a suor = cheiro não tão agradável quanto isso, mas a intenção foi boa, pensemos assim.
Como vossa mui adorada utilizadora, cuja compra do passe mensal alimenta as bocas da vossa família, venho por este modo avisar de mais um flagelo a combater em prol de uma viagem mais confortável: música tocada em altifalantes do telemóvel.
Há poucas tão irritantes como estar num autocarro a ouvir música que não é nossa e que só com muita muita MUITA sorte será algo que agrade os nossos ouvidos. (devo confessar que nunca aconteceu ouvir algo que me agrade, pois parece haver uma correlação entre o gosto por música brazileira/hip-hop/kuduru/chunga-em-geral e altifalantes do telemóvel)
Está na moda lutar contra a poluição e como tal incito-vos a lutar contra esta poluição sonora que povoa o mundo dos transportes públicos.
Para tal deixo aqui uma suestão de actuação: primeiro passo, acção de sensibilização. Já que gostam tanto de afixar cartazes que ninguém lê e post-its que toda a gente rouba (mas a que
ninguém liga nenhuma, sejamos honestos) façam lá uma campanhazinha a apelar à moral e aos bons costumes, ao respeito cívico e a essas coisas que eu seriamente desconfio não existirem. Pode ser que convençam alguém que ouvir música aos berros não é lá muito simpático. E até dá para fazer uns slogans engraçados para a campanha: "Acredito que tenhas um óptimo gosto musical, mas não preciso de o confirmar."
Como me quer parecer que a abordagem cívica não vai ter lá grande efeito segue-se o segundo passo: desatar a oferecer coisas. Lembram-se daquela altura em que ofereceram, não sei bem porque raio, sementes de salsa? Podem fazer mais ou menos a mesma coisa, mas oferecendo auscultadores. Não é assim tão caro, (ninguém está a exigir phones de quarenta euros da apple) bem negociado conseguem comprá-los a um euro à dúzia no chinês. E na embalagem metem o slogan que já usaram no cartaz - há que reutilizar. É que toda a gente gosta de coisas grátis, e existe uma compulsão quase biológica a usar tudo o que é oferecido, por isso é que as canetas do PSD e as t-shirts da Antena 3 têm sempre saída. É a velha ideia de "se é de graça mais vale aproveitar".
Mas como, certamente, mesmo com coisas oferecidas e posters colados a dois centimetros de distância dos olhos, ainda existirão otários que insistem em partilhar a sua chungaria com o incauto viajante de autocarro sugiro um terceiro, final e mais drástico passo: coima e outra punições. É sabido que toda a gente com poder suficiente para isso gosta da possibilidade de poder multar quem lhe apetecer pelo motivo que lhe apetecer. E a Carris não será excepção. Se eu andasse por aí, feliz e contente, a passear-me de autocarro sem pagar bilhete era multada sem que sequer pensassem duas vezes. E se alguém tivesse a mui infeliz ideia de acender um cigarro num autocarro não só era multado em sabe lá Deus quantas centenas de euros, como provavelmente ainda era corrido do autocarro a pontapé e, certamente, ainda teria de aturar os comentários das velhotas de: "Meu Deus este mundo está perdido, já não bastava estar ali a matar-se com aquilo, ainda vem dar cabo dos pulmões dos outros. E eu cá não posso respirar aquele fumo, que a minha bronquite ataca logo!"
Pois bem, se dar cabo dos pulmões alheios é punível com multa, dar cabo do cérebro (que quer me parecer ser um órgão bem mais essencial) alheio devia sê-lo três vezes mais. E uma multa bem alta, acrescento, que é para que quem a tenha de a pagar se veja forçado a vender o telemóvel e nunca mais possa chatear pessoas inocentes com o raio da sua música.
Partir-lhes os dentes ao pontapé também me parece uma adição à multa aceitável, dado o nível de irritação causado, mas é uma sugestão meramente pessoal.

Sem mais a acrescentar, os meus mais sinceros cumprimentos.

1 comentário:

Anónimo disse...

Só para que conte ouvir musica sem os chamados phones em locais públicos é proibido por lei.

Só que infelizmente toda a gente fecha os olhos (neste caso os ouvidos) com medo de ser atacados por um qualquer gange selvagem.